quinta-feira, 26 de setembro de 2013

UNIÕES SIMULTÂNEAS, MONOGRAMIA E FIDELIDADE

- a tradicional frase, "viveram felizes para sempre" não existe mais e os conceitos de monogamia e fidelidade ficam na esfera dos pactos entre os conviventes -


A monogamia, princípio organizador das relações da família conjugal no Ocidente, será discutida no IX Congresso Brasileiro de Direito de Família que acontece entre os dias 20 e 22 de novembro, em Araxá (MG). Nesta entrevista, o advogado Marcos Alves da Silva (PR), membro do Ibdfam, fala como este princípio foi e continua sendo utilizado como forma de controle da sexualidade feminina e como a discriminação jurídica que sofrem as famílias que se formam paralelamente ao casamento perdura durante séculos, “em nome da proteção à sagrada família formada pelo casamento”, e diz que “muitas mulheres intituladas concubinas, e sem nome, porque são ‘a outra’, criam filhos, e por longos anos assumem a responsabilidade pela casa, formam efetivamente uma família, reconhecida como tal sociologicamente, mas condenadas à invisibilidade jurídica em nome de um princípio, o da monogamia”. Conheça detalhes jurídicos sobre a aplicabilidade destes temas hoje no Direito de Família...

1 - O que caracteriza o rompimento do princípio jurídico da monogamia?
 É necessário lembrar que a monogamia, considerada como regra ou princípio, sempre constituiu forma de controle da sexualidade, mormente da sexualidade da mulher. Ou esse controle era exercido pelo homem, e se revelava nas multiformes manifestações da dominação masculina, ou a regulação era exercida pela Igreja, ou pelo Estado, quando este chamou a si o regramento do casamento. Por isso, não se pode opor monogamia à poligamia. A poligamia admitida e praticada no oriente e no continente africano, talvez constitua modelo de dominação ainda mais severo que o da monogamia, no Ocidente. 
A monogamia foi erigida à condição de princípio jurídico par e passo à construção da regra da presunção da paternidade do marido em relação aos filhos nascidos de sua mulher. Vinculada a esta ideia está o tabu da virgindade e, também, a punição do adultério da mulher. O controle de sua sexualidade feminina constituiu e de certa forma ainda constitui instrumento de controle da prole do marido.
O princípio da monogamia está diretamente vinculado à distinção entre família legítima e família ilegítima, a família formada pelo casamento e concubinato. Portanto, o princípio é perfeitamente adequado à tutela da família transmissora do patrimônio, transpessoal. O princípio da monogamia pressupõe uma família merecedora da tutela do Estado e outra que fica fora deste âmbito de proteção. A tese do rompimento ou da superação da monogamia como princípio estruturante do estatuto jurídico da família verifica-se em função do reconhecimento do princípio da pluralidade das entidades familiares e, também, da superação da família formada pelo casamento como modelo superior reconhecido pelo Estado. À medida que o caput do art. 226 da Constituição Federal é compreendido como cláusula geral de inclusão e de tutela das famílias em suas multiformes manifestações, não há razão para se preterir uma família em benefício de outra pela simples razão de ser esta oriunda do casamento e aquela de uma união não formalizada.
A família foi funcionalizada ao desenvolvimento da personalidade e à realização das pessoas que integram o núcleo familiar. Não é mais tutelada como instituição que tem, em si, valor jurídico, independente das pessoas que a integram. Se assim é, não subsiste razão para se seguir afirmando que prevalecesse no ordenamento jurídico o princípio da monogamia. Este se presta, antes, a fomentar a construção de um lugar de não-direito. Sua utilização conduz especialmente as mulheres designadas pela pecha de concubina a uma condição de invisibilidade jurídica.
Os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da solidariedade, da igualdade, da liberdade e da democracia incidentes sobre as relações familiares, não permitem mais a afirmação de que a monogamia subsiste como princípio do Direito de Família. 

2 - Por vezes, confundimos monogamia com fidelidade. O que diferencia esses dois princípios culturais e jurídicos e como se relacionam?

De fato, a fidelidade como expressão de um dever jurídico decorrente do casamento tem direta relação com o princípio da monogamia. A fidelidade conjugal significando exclusividade nas relações sexuais já constitui bem jurídico de interesse social. Tanto é assim, que o adultério constitui crime. Como a família formada pelo casamento constituía bem jurídico em si, a falta em relação ao dever de fidelidade atingia a instituição do matrimônio. Atualmente, não existe dever jurídico de fidelidade. O que consta do Código Civil não passa de um conselho moral sem qualquer eficácia jurídica. Especialmente depois da Emenda nº 66 o divórcio revelou-se como direito potestativo, desembaraçado de prazos ou de qualquer outro pré-requisito. Assenta-se exclusivamente na liberdade de não permanecer casado.
A culpa perdeu campo na dissolução dos vínculos matrimoniais. Logo, a fidelidade pode constituir norma interna de uma relação de conjugalidade, formalizada ou não pelo casamento, mas, não subiste como norma estatal. Não faz qualquer sentido que o Estado venha se imiscuir nas relações de conjugalidade para impor, por força de lei, o dever de fidelidade. O próprio princípio da liberdade assegura aos cônjuges a reserva de sua intimidade. Reclama-se, hoje, a ampliação do campo do exercício da liberdade especialmente no que se refere às situações subjetivas co-existenciais. As relações de conjugalidade não podem ser mantidas por regras heterônomas, impostas pelo Estado. Não há dique estatal que estanque a liberdade conquistada. O casamento ou a união estável somente se mantêm pela repactuação constante da relação.
Assim, a fidelidade, certamente existe como norma interna de determinada conjugalidade.  Mas, ruiu-se como regra de Estado prefixada para todo casamento e até para a união estável. Para essa, o codificador lançou mão de um eufemismo. Não teve coragem de dizer fidelidade, falou, então, em dever de lealdade. Pode-se dizer, então, que fidelidade como dever jurídico do casamento civil é conceito diretamente vinculado à noção de monogamia. Mas, pode ser reconhecida a fidelidade como situação de exercício de liberdade, no âmbito do que já foi chamado reserva da intimidade.                                                       
3 - Por que a monogamia pode ser considerada um instrumento de exclusão de muitas formas de famílias? 
No Brasil, o concubinato, desde os primeiros dias da Colônia, constituiu um não-lugar no sistema, isto é, sempre habitou marginalidade jurídica. Num país em que a dominação masculina e o desprezo em relação à mulher índia, negra, mestiça foram sempre a tônica, a monogamia, erigida à condição de princípio jurídico, se prestou como instrumento perfeito para a desqualificação de inúmeras famílias formadas à margem da família reconhecida oficialmente, isto é, a surgida do casamento civil. O concubinato não foi tratado pelo Direito de Família brasileiro até a década de 1960. Nós teremos ainda vergonha de nosso passado recente e do grau de discriminação jurídica que sofrem as famílias que se formam paralelamente ao casamento. Repetimos e legitimamos discriminação que já se estende por séculos.
Em nome da proteção à sagrada família formada pelo casamento, muitas mulheres intituladas concubinas, e sem nome, porque são "a outra", criam filhos, e por longos anos assumem a responsabilidade pela casa, formam efetivamente uma família, reconhecida como tal sociologicamente, mas condenadas à invisibilidade jurídica em nome de um princípio, o da monogamia.
Por outro lado, o Estado cometeria um desatino ao não reconhecer famílias que, em razão da liberdade de seus integrantes, não se formam por par homo ou heterossexual, mas, se formam por meio de uma conjugalidade plúrima, que tem sido designada como poliamor. Que razões minimamente razoáveis — para ser redundante — poderia evocar o Estado para não reconhecer, por exemplo, união estável estabelecida entre três pessoas, como a do caso de Tupã - SP, que se tornou notória. Se tais famílias existem, não podem ser condenadas à invisibilidade jurídica em homenagem ao princípio da monogamia.    
4 - Como a superação da monogamia como princípio jurídico poderia ser uma ferramenta para assegurar que a diversidade das formas de família seja um direito legítimo do cidadão? 
De fato, a superação da monogamia como principio, constitui questão de cidadania. Num Estado plural e laico, todos devem ter espaço para a livre constituição de família. Não cabe ao Estado, em atenção a princípios arcaicos e injustificáveis, no atual estágio de desenvolvimento do Direito das Famílias, colocar obstáculos ao reconhecimento das diversas formas de constituição de família. 
Ainda que haja uma maioria religiosa e mesmo uma hegemônica compreensão moral de que a monogamia deve nortear as relações de conjugalidade, esta maioria não tem o direito de impor à totalidade dos cidadãos um modelo único de família. A democracia é o difícil exercício de construção de um espaço onde caibam todos, convivendo com respeito e profunda consideração ao direito de ser diferente. A igualdade pressupõe o direito à diversidade. 
5 - Como o tema Uniões simultâneas, Monogamia e dever a fidelidade se relaciona ao tema central do Congresso: Famílias, Pluralidade e Felicidade”?
A relação é imediata. A família não é uma instituição criada pelo Estado e nem pode ser por ele rigidamente delimitada e, muito menos funcionalizada a interesses ditos superiores. As famílias contemporâneas têm uma vocação já há algum tempo bem sinalizada por Michelle Perrot: a realização e, portanto, a felicidade daqueles que a integram. 
Não existe cânone para a felicidade. As formas, os meios e os sentidos da realização humana são tão diversos como o são as próprias pessoas. Logo, não existe modelo para felicidade e nenhum pode ser imposto como o ideal sob pena de negação da própria felicidade. Assim, a pluralidade em matéria de Direito das Famílias é decorrência necessária da própria idéia de felicidade. A monogamia é regra de um modelo envelhecido, que não encontra reverberação na dinâmica estonteante da contemporaneidade.
Se o Direito não está posto para ditar o modelo único de uma família idealizada do passado, os juristas devem afastar o medo de se defrontarem com o diferente, com o Outro em suas múltiplas experiências de ser e de se fazer humano.


6 - Se na sociedade contemporânea não há como modelar uma concepção majoritária de Felicidade, o que precisa ser alterado para que o Direito de Família contribua  para assegurar essa felicidade plural como um direito social?  
Se há uma tendência clara em relação ao Direito das Famílias contemporâneo, esta se encontra na afirmação da liberdade como princípio norteador. A intervenção excessivamente regulatória do Estado especialmente em matéria de conjugalidade revela-se como postura indesejada, inoportuna, contrária à expressão plural e informal das famílias contemporâneas. Toda regulação da família a partir de uma dada concepção moral, ainda que demograficamente majoritária, mostra-se incongruente com o princípio da democracia e com a laicidade do Estado. Não existe um modelo de família ideal, adequado à realização de uma felicidade também idealizada e tudo isso capturado e esboçado em um paradigma legal como o do casamento, com suas regas, deveres e obrigações previamente constituídos. 
Evidentemente, os deveres conjugais, por exemplo, previstos nos art. 1.566 do Código Civil, são a expressão de um ideário, de um modelo de felicidade em abstrato. O Estado ingressa na intimidade da casa para dizer que a família feliz é aquela na qual são respeitados os deveres de fidelidade recíproca, vida em comum no domicílio conjugal, assistência mútua, sustento, guarda e educação dos filhos, respeito e considerações mútuos. A questão é que tal intervenção tornou-se um verdadeiro fiasco. Os deveres se converteram em meros conselhos morais, destituídos de qualquer eficácia jurídica. O Estado legislador, nesta matéria, cumpre papel sem nenhum protagonismo. A felicidade não pode ser contida na regulação de uma conjugalidade eleita pelo Estado. As pessoas reivindicam para si, com veemência, o direito de auto-regularem as suas relações familiares. A felicidade não pode ser dada, há de ser construída pela liberdade e criatividade daqueles que se sentem desafiados à aventura de uma vida fundada na fragilidade dos laços do amor.
Logo, o que precisa ser alterado é o senso comum dos juristas que, abstraídos da realidade multifacetada das famílias contemporâneas, insistem em um modelo paradigmático do passado, o casamento civil. Os antidivorcistas das décadas de 60 e 70 do século passado estavam certos de que com a possibilidade do divórcio a família e o projeto de felicidade nela idealizado se esboroariam. Atualmente, ainda está entrincheirada em uma mentalidade reacionária prevalecente a felicidade idealizada e pressuposta no modelo legal matrimonializado de família. Daí as reações quase raivosas face às uniões homoafetivas ou à co-existência de conjugalidades simultâneas, ou ao poliamor. A questão da felicidade é aqui central. Como bem o disse Caetano: "Quando eu te encarei frente a frente não vi o meu rosto/  Chamei de mau gosto o que vi, de mau gosto, mau gosto/ É que Narciso acha feio o que não é espelho / E à mente apavora o que ainda não é mesmo velho".
Numa sociedade plural e democrática, há de existir lugar para todos. A liberdade de ser e de se fazer é indispensável à felicidade, como realização da pessoa humana. Logo, a felicidade desafia uma revolução jurídica no mundo do Direito das Famílias. O Estado regulador deve ser, o quanto possível, afastado para abrir campo à liberdade nas situações subjetivas co-existenciais. Sua presença só tem sentido para o resguardo e tutela dos que se encontram em situação de vulnerabilidade nas relações familiares.
 999

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

DOMINGO ESPETACULAR DA RECORD EXIBE MATÉRIA SOBRE OS BRASILEIROS PRESOS HÁ NOVE MESES NA BOLÍVIA

O caso de Jean Carlos da Silva e Roberta Lehmkuhl, presos na Bolívia desde 08 de dezembro de 2012, sem que provas sejam apresentadas que justifiquem a prisão. Eles foram acusados de uso indevido de influência em razão do cargo, crime atribuído  à funcionários públicos. Ocorre que nunca foram funcionários públicos. As outras pessoas envolvidas na denuncia - todos bolivianos ocupantes de cargos, já foram excluídas do processo.



Saibam os detalhes na matéria exibida em 15 de setembro de 2013, no link abaixo:

http://noticias.r7.com/videos/com-suspeitas-de-corrupcao-brasileiros-vivem-presos-na-bolivia-ha-nove-meses/idmedia/523662890cf208c65704b412.html



domingo, 1 de setembro de 2013

AÇÕES EM BRASÍLIA EM PROL DE JEAN E CARLA


Como vocês leram no primeiro post de nosso novo blog, estivemos em Brasília de 27 à 30 de agosto, numa missão especial. Não foi fácil buscar apoio em Brasília, junto aos órgãos governamentais, em prol de dois blumenauenses presos na Bolívia desde 08 de dezembro de 2012. O objetivo era exigir posicionamento e providências das autoridades justamente na mesma semana em que o Brasil estava envolvido num problema diplomático, ao dar asilo político ao senador boliviano Roger Pinto Molina, condenado por corrupção e outros crimes na Bolívia. 

Decorrência deste escândalo diplomático, foram removidos o embaixador do Brasil em La Paz, Marcel Fortuna Biato, e do encarregado de negócios da embaixada, Eduardo Saboia, para a Secretaria de Estado, que tem sede em Brasília. A portaria que determinou as remoções foi assinada pelo novo ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo Machado, que tomou posse nesta quarta, quando eu estava em reunião com o Itamaraty
Saboia admitiu que foi o responsável por organizar a operação que trouxe o senador boliviano Roger Pinto Molina ao Brasil no fim de semana. Molina, condenado pela justiça boliviana se diz perseguido político do governo Evo Morales. Ele vivia como asilado na embaixada do Brasil em La Paz havia mais de um ano. Saboia disse que organizou a viagem de Molina para o Brasil porque "havia o risco iminente à vida e à dignidade do senador". Molina foi trazido para o Brasil em um carro oficial sem autorização do governo boliviano. Após o episódio, o ex-ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, foi demitido do cargo.

No Itamaraty fomos recebidos pelo diplomata e secretário Marcelo Ferraz, onde buscamos auxílio para que a Embaixada Brasileira na Bolívia prestasse a assistência necessária aos brasileiros, assim como exigissem que o princípio da ampla defesa fosse assegurado à eles pelo Judiciário boliviano. 

Buscamos informar sobre o caso e obter apoio junto ao líder da bancada catarinense no Congresso, Marco Tebaldi, e do deputado Décio Lima. No Senado fomos em busca de divulgar o caso dos catarinenses junto ao senador Luiz Henrique da Silveira e Ricardo Ferraço, este último, que trouxe o embaixador Boliviano Roger Pinto Molina em seu jatinho particular até Brasília.

Estivemos com o embaixador da Bolívia no Brasil, Jerjes Justiniano Talavera, onde buscamos apoio para que o processo contra Jean e Carla fosse justo, correto e se possível, auxiliasse os brasileiros em seu pais, evitando violação de direitos humanos.

Conseguimos também sermos recebidos pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, por Irina Karla Bacci (Coordenadora Geral da Ouvidoria de Direitos Humanos), por Michelle Moraes de Sá e Silva (coordenadora Geral de Cooperação Internacional) e Julia Schirmer (assessora do Departamento de Relações Internacionais) que se prontificaram em articular com o Itamaraty para obter cópia de todo o processo que tramita contra os blumenauenses, assim como saber da nova data de julgamento do processo.

Enquanto estávamos em Brasília, na quinta-feira à noite, recebi a notícia de Carla e Jean que o fiscal de matéria e diretor de investigações de delitos de corrupção (equivalente a um promotor de justiça), Aldo R. Ortiz Troche, que abriu o processo contra os brasileiros, foi afastado do cargo, acusado de corrupção, no final daquela noite (29 de agosto de 2013).

Se o investigador chefe que ofereceu a denuncia acusando dois brasileiros que estavam na Bolívia, acusados de uso indevido de influência e benefício em razão de cargo é corrupto, o que esperar da Justiça boliviana?

Exigimos e esperamos do Governo Brasileiro, o apoio necessário para trazer estes dois blumenauenses de volta ao lar.



BLUMENAUENSES PRESOS NA BOLÍVIA PEDEM AJUDA ÀS AUTORIDADES COM AUXÍLIO DA ADVOGADA ROSANE MARTINS


Na semana em que houve substituição do Ministro das Relações Exteriores e de diplomatas brasileiros na Bolívia, por estarem envolvidos no pedido de asilo político do senador de oposição Pinto Molina no Brasil, brasileiros presos naquele país pedem ajuda às autoridades brasileiras

Os brasileiros Jean Carlos da Silva e Carla Roberta Lehmkuhl, naturais de Blumenau (SC), que residem legalmente em La Paz (Bolívia) desde maio de 2010, estão presos de forma arbitrária no país vizinho e pedem ajuda as autoridades brasileiras para voltarem ao Brasil. Eles foram presos em dezembro de 2012 acusados de “uso indevido de influências em benefício e razão do cargo”. Jean foi levado para uma prisão de segurança máxima e a esposa, Carla, permanece em prisão domiciliar, ou seja, não pode voltar para o Brasil. No processo, no qual eles são acusados, mais 16 pessoas haviam sido indiciadas e já foram absolvidas ou libertadas. Para os brasileiros já foram marcadas 15 audiências e todas elas não aconteceram por “motivos fúteis”.

De acordo com a advogada Rosane Magaly Martins, contratada pela família no Brasil, no dia 30 de agosto, inclusive, o fiscal de matéria e diretor funcional das investigações da Fiscalia Especializada em Persecucíon de Delitos de Corrupcion do Departamento de La Paz (cargo que se iguala ao promotor público no Brasil), Aldo R. Ortiz Troche, que entrou com a denúncia contra os brasileiros, foi afastado do cargo acusado de corrupção no último dia 30 de agosto. “E mesmo assim não vejo nenhuma ação para resolver o caso dos brasileiros”, afirma.

A advogada esteve na semana passada, dias 28, 29 e 30 em Brasília, e apresentou o caso para o líder da bancada catarinense na Câmara de Deputados, Marco Tebaldi, ao deputado federal Décio Lima, ao presidente da comissão das Relações Exteriores do Senado, Ricardo Ferraço, no Itamaraty para o diplomata secretário Marcelo Ferraz. Participou de reunião na Embaixada da Bolívia com o embaixador Jerjes Justiniano Talavera, além da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.

De acordo com Rosane, conforme o Código Penal da Bolívia, somente se podem ser acusados pela prática deste delito, pessoas que estejam no cargo de funcionários públicos, e eles, como estrangeiros jamais ocuparam cargo público além de não haver prova alguma nos autos, de que tenham cometido os delitos indicados.

A família acredita na inocência do casal e afirma que “se os brasileiros tiverem cometido algum delito devem responder por eles”. Porém, não da forma como está ocorrendo. Rosane conta que Jean estava preso até três meses atrás na Penal de Segurança Máxima de Chonchorro, para onde são levados os ladrões e os assassinos. Por apresentar vários problemas de saúde decorrentes da prisão prolongada (hipertensão, problemas cardíacos, pulmonares, gástricos e com depressão), Jean está internado desde junho de 2013 na Casa de Saúde San Miguel, com guardas que fazem vigia 24h.

Conheça mais detalhes

A empresa brasileira Global Forest, para a qual o casal trabalhava, contratou dois advogados bolivianos para cuidarem do caso, que se arrasta pelo Judiciário daquele país por quase 9 meses consecutivos, onde 15 audiências designadas e apenas uma realizada (em 18 de agosto, onde foi indeferido novamente seu pedido de liberdade) e as outras 14 suspensas por articulação do Ministério Público e membros do governo, que não têm interesse em esclarecer o caso, por envolver membros do alto escalão do Governo de Evo Morales.

A família blumenauense - até a internação de Jean Carlos da Silva, não tinha muitos detalhes acerca do caso pois ele estava incomunicável em Chonchocorro e agora está em completo desespero. Já solicitaram ajuda para a Embaixada do Brasil na Bolívia, da Bolívia no Brasil, mas nada de concreto foi feito em favor destes brasileiros.

A família não quer que seja libertado um criminoso (seu filho Jean), mas sim sejam libertadas as pessoas que foram para aquele país em busca de trabalho e uma boa remuneração, e que não possuem patrimônio, são pessoas simples filhos de pessoas simples de Blumenau e que os direitos humanos assim como as regras sejam aplicadas à todos os 18 envolvidos e não apenas contra os dois brasileiros.

Jean e Carla estão totalmente desprovidos de qualquer apoio efetivo do Governo Brasileiro, pois já recorreram a embaixada em La Paz, que deixa claro que nada se pode fazer, pois eles são apenas um entre muitos brasileiros presos naquele país e por isso não podem fazer nada.

Será necessário que o Governo Brasileiro, através de suas autoridades competentes (Ministério da Justiça, do Itamaraty, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e da Embaixada Brasileira na Bolívia), exija do Governo Boliviano que o Judiciário do país vizinho deixe de tratar casos envolvendo brasileiros com descaso, permitindo diversas irregularidades, como as sucessivas suspensões de audiências, não observância do devido processo legal, da falta de materialidade do delito e da impossibilidade de que um estrangeiro possa ser parte passiva numa ação criminal por uso indevido de influência e benefício em razão de cargo sem que nem funcionário público sejam (artigo 146 e 147 do Código Penal da Bolívia e Lei 004/2010).

Os advogados bolivianos contratados para a defesa de Jean e Carla possuem documentação que pode comprovar tais irregularidades e ações ilegais feitas por autoridades da Justiça Boliviana.

 Bolivianos que ocupam cargos públicos, denunciados na Resolucion de Imputación 28/2012e que estão em liberdade:

- Marcos Farfan Farjat, ex vice- ministro de Régimen Interior del Ministério del Gobierno da Bolívia;
- Boris Villegas Rocabalo (ex-diretor), Denis Efrain Rodas Limachi (ex assessor jurídico del Ministerio de Gobierno), Rodrigo Limpias, Paolo Peredo (advogado), funcionários do Ministério do Governo
- Carlos Antonio Fiorilo Cruz, investigador
- Pablo Patiño Cuba, tenente de la policia e investigador designado
- Jesus Quicaña Patiño, investigador
- Julia Parra, juíza segundo de Instrucción em lo Penal
- Rolando Sarmiento, ex juiz noveno de Instrucción em lo Penal
Marcos Farfan Ex Viceministro Régimen Interior del Ministerio de Gobierno
Boris Villegas Rocabado Ex Director de Régimen Interior
Julia parra Condori Ex Juez Segundo de Instrucción en lo Penal
Rolando Sarmiento Ex Juez Noveno de Instrucción en lo Penal
Denis Efrain Rodas Limachi ex asesor jurídico del Ministerio de Gobierno
Pablo Patiño Cuba Tnete. de la Policía  e investigador asignado.

E outros funcionários não citados da Autoridade de Bosques e Terras da Bolívia


RESPOSTA DO CONSULADO EM LA PAZ


O vice-cônsul da Embaixada Brasileira em La Paz, Pedro Maciel, informou à família por e-mail (recebido em 18/08/13) que acompanha o desenrolar do caso via assessoria jurídica e que foram feitas duas visitas (nos nove meses em que estão presos) aos brasileiros com vistas a acompanhar o tratamento dado pelas autoridades carcerárias aos dois. Pedro Maciel acredita que o caso toma proporção política no país e que talvez os absolvidos voltem a ser presos – no caso, os funcionários corruptos do governo de Evo Morales.

O vice-cônsul disse ainda que o assessor jurídico da Embaixada, Dr. Miguel Blancourt, mantém contato com o atual advogado do casal, senhor Ramiro Veja. Sugeriu ainda que denuncie as movimentações escusas dentro do Judiciário pois auxiliaria a Embaixada no sentido de fazer com que o processo se desenrole.

O próprio vice-cônsul confessa no e-mail que o desempenho do judiciário boliviano é falho, pois os tribunais, em razão da burocracia e da falta de preparo de seus titulares, enfrentam dificuldades com relação ao tratamento da justiça. A falta de recursos e de preparação acadêmica prejudicam ainda mais o caso.

Nesse contexto, a Embaixada se comprometeu em fazer levantamento para enviar nota à Chancelaria de La Paz, autoridade interlocutora de missões diplomáticas, relatando todos os casos de brasileiros detidos na Bolívia que tenham o processo, de alguma forma, emperrado. 

A versão de Jean Carlos da Silva é outra. O advogado da Embaixada Brasileira o visitou duas vezes no Penal de Chonchocorro, uma para saber o motivo da detenção e outra para entregar uma cesta de natal.  A última visita foi na clínica onde está internado, onde permaneceu por duas horas apenas. O advogado que é boliviano e presta assessoria para embaixada brasileira comentou com Jean que a detenção foi ilegal, mas nada vez para auxiliar ambos.

Depois disto a Embaixada Brasileira tencionou intermediar um acordo com a parte contrária e solicitou o pagamento de R$ 2 milhões de dólares para arquivar o caso. Jean e Carla descobriram que funcionários da embaixada brasileira têm relações de amizade com a sogra de Jefferson Cirilo, já que a mesma promove eventos para embaixada e para os brasileiros.

O advogado do casal já divulgou em nível nacional as irregularidades desde caso, inclusive foi feita uma denúncia contra a senadora opositora do governo, Sra. Carmem Eva Gonzales e a outras autoridades por estar violando o direito dos brasileiros, divulgando vídeos editados que comprometem membros do Governo de Evo Morales, do próprio governo brasileiro e seu respectivo embaixador em La Paz/Bolívia.



BRASILEIRO SE COMUNICA PELO SKYPE OU POR E-MAIL DO HOSPITAL. CONFIRA SEU DEPOIMENTO


“Meu nome é Jean Carlos da Silva, cidadão brasileiro e me encontro fora do pais sofrendo uma série de irregularidade as quais vou mencionar em seguida.

Tudo começou em 2010 quando eu fui convidado por uma empresa exportadora de madeira – Global Forest (empresa exportadora de madeiras atuante em 57 países nos cinco continentes), para vir trabalhar na Bolívia. Esta empresa já estava atuando na Bolívia desde 2005 com outros funcionários brasileiros. Com minha chegada e de minha esposa, pudemos evidenciar uma série de irregularidades que tais funcionários estavam fazendo no país. Auditores contratados pela Global Forest constataram vários pagamentos e retiradas de dinheiro injustificáveis e a partir deste momento os problemas iniciaram. Como a empresa/filial da Global Forest na Bolívia foi constituída no nome destes dois brasileiros, começaram as extorsões.

Um destes dois brasileiros – Jefferson Kill Cirilo e Claudiney Kolinski exigiam uma quantia superior a U$ 200 mil dólares por sua rescisão de contrato de trabalho, e disse que somente iria transferir a empresa que estava em seu nome para o empresário brasileiro caso pagasse os U$ 200 mil.

O dono da empresa – Anderson Giovani Rocha, apurou o valor devido aos funcionários (em torno de U$ 50 mil) e foi até a Bolívia para realizar o acordo. Como não aceitaram e não transferiram a empresa, ele formalizou uma denúncia contra os funcionários, que acabaram sendo detidos por ficar comprovado o desvio de dinheiro da empresa.

Foi neste momento que eu, Jean Carlos da Silva, entro na história, pois o proprietário da Global Forest me nomeia seu representante legal na Bolívia, para representa-lo nas audiências e para dar continuidade dos negócios neste país. E em decorrência destas denúncias feitas contra os ex-funcionários, condenados e cumprindo pena em detenção domiciliar, eles raivosos e sem conseguir o dinheiro pretendido, fizeram uma série de acusações graves contra mim, minha esposa e o dono da Global Forest.

No dia 08 de dezembro de 2012 eu e minha esposa fomos arbitrariamente presos por civis que diziam ser policiais da inteligência do governo, no aeroporto de El Alto, às 5 da manhã, quando fazíamos check-in para virmos ao Brasil participar da festa de 80 anos de meu pai em Blumenau (SC). Os policiais nos prenderam como se fossemos os piores bandidos, nossas malas foram abandonadas no aeroporto – inclusive deixaram por lá nossa cachorrinha. Apreenderam nossos documentos (brasileiros e bolivianos). Na delegacia um promotor apresentou um pedido de prisão preventiva, mesmo tendo comprovado que tínhamos emprego e residência fixa na Bolívia. Soubemos qual seria a acusação dias depois, recolhidos em presídio de segurança máxima. A denúncia formalizada pelo Ministério Público da Bolívia é que fizemos “USO INDEVIDO DE INLUENCIAS EM BENECIFIO EM RAZAO DO CARGO” (eu, minha esposa Carla e o dono da Global Forest) e outros 10 funcionários do governo boliviano -  ministros, vice ministros, advogados, juízes, promotores de justiça, policiais entre outros. Segundo o promotor, o dono da Global Forest utilizou influencias do governo boliviano para receber benefícios.

O que mais me chama atenção é que duas semanas antes da nossa prisão eu estive em Brasileia (Acre), cidade que tem divisa com a Bolívia sem problema algum. Nossas passagens aéreas para o Brasil haviam sido adquiridas em outubro, portanto jamais quis fugir do país, como agora alega o Ministério Público para manter-nos aprisionados.

Fomos levados a umas celas judiciais provisórias para aguardar uma audiência com um juiz que determinaria nossa situação legal. A juíza que estava de turno (por ser um sábado) se recusou a nos julgar porque a mesma também havia sido indiciada neste caso.

Transferiram-nos para a cidade de El Alto no dia 08 de dezembro à noite. O que nos impressionou e nos deixou assustados foi à forma desta transferência, pois existiam mais de 30 policias fortemente armados nos escoltando, como se fossemos bandidos de alta periculosidade internacional.

No dia 09 de dezembro o juiz de El Alto, por solicitação do promotor de justiça, determinou nossa detenção numa Penitenciária de Segurança Máxima, junto com condenados há mais de 20 anos por assassinato e outros crimes graves. Mesmo apresentando todos os documentos legais de regular funcionamento de nossa empresa, das contas bancaria com movimentação de 20 mil dólares, impostos recolhidos em dia (tanto da empresa como de funcionários), contratos de alugueis do escritório, do depósito das madeiras e domicilio meu e de minha esposa, o juiz nem se deu ao trabalho de verificar esta documentação apresentada.

Esclareço mais uma vez de que a acusação que estão fazendo contra nós é de: “USO INDEVIDO DE INFLUENCIAS EM BENECIFIO EM RAZAO DO CARGO”, que conforme o Código Penal deste País somente se pode ser acusar por este delito funcionários públicos.

No dia 10 de janeiro, ou seja, mais de um mês encarcerados, marcaram nossa audiência, em instância superior, pedindo liberdade provisória ou condicional pela prisão indevida. Foi concedido o benefício de prisão domiciliar  para minha esposa Carla. O que chama nossa atenção é que na resolução desta audiência os próprios juízes afirmam de que não podemos estar detidos por não sermos funcionários públicos, mas com dois pesos e duas medidas relaxam a prisão de uma e mantém a outra presa.

Depois desta audiência já se passaram mais de sete meses e continuo preso indevidamente, depois de solicitar a realização de quinze audiências onde reitero o pedido de liberdade e nenhuma audiência se conclui, pelo fato de que o Ministério Público e os denunciantes Jefferson Kill Cirilo e Claudiney Kolinski emperram o processo, pedem a suspensão da audiência por motivos fúteis, os juízes são substituídos. Já foram deferidos dois pedidos de habeas corpus mas nenhum foi cumprido.

Já recorremos a Embaixada Brasileira em La Paz, que deixou claro que nada pode fazer, que somos um numero a mais entre outros brasileiros presos na Bolívia e que a Justiça do país é desorganizada e nada podem fazer. Entretanto há um agravante pois a sogra do denunciante Jefferson Cirilo é promotora de eventos junto à Embaixada Brasileira na Bolívia. Um cônsul - que prefiro não mencionar nome neste momento, tentou mediar um acordo entre os denunciantes e meus advogados, pedindo que pagássemos U$ 2 milhões e tudo estaria resolvido e a denúncia seria retirada.

Pelo que percebo virei moeda de troca, quando pessoas do Governo Brasileiro e Boliviano querem tirar algum proveito econômico e politico disto tudo enquanto eu fico preso, sem direitos assegurados. A parte contraria, representada pelo Ministério Público, deixou bem claro na audiência de janeiro em frente aos juízes, depois que me pronunciei sobre as irregularidades da minha prisão, falaram que se eles sofreram eu também teria que sofrer.

Na segunda semana de agosto saiu uma resolução/sentença onde das 18 pessoas processadas inicialmente, 16 foram absolvidas e somente eu e minha esposa continuamos presos e processados, sendo que somos estrangeiros e não temos ligação alguma com o governo Boliviano.

Hoje me encontro internado em um centro clinico, sempre com escolta de policiais e algemado ao leito hospitalar,  por meu organismo não suportar tanto sofrimento:  estou com problemas cardíacos, falta de ar, pressão alta e problemas psicológicos de depressão.

Quero deixar claro a todos que de minha parte não existe nenhum interesse político muito menos econômico, pois era empregado da Global Forest, estava na Bolívia respondendo a ordens e fazendo todas as atividades dentro da legalidade. Podem verificar minha situação fiscal e bancária tanto da Bolívia quanto no Brasil que sou pessoa simples, honesta, que tenho quase nenhum patrimônio fruto do meu trabalho honesto.

Peço socorro às autoridades dos meus pais e ao povo brasileiro para que me ajudem a sair deste inferno que estou vivendo, porque uma pessoa só aprende dar mais valor ao seu país quando se encontra fora dele.

Tenho um grande temor em ficar nesta situação por até três anos, pois este seria o tempo legal na Bolívia permitido que uma pessoa possa permanecer presa enquanto é investigada pela prática de um crime – um absurdo e uma violação dos direitos humanos.



Rosane Martins com o embaixador da Bolívia,
Jerjes Justiniano, em 29 de agosto de 2013 


Jean e Carla, no Hospital, aguardando auxílio
das autoridades brasileiras